domingo, 29 de junho de 2014

glaciar.

Apaguei-te a luz.
Sufoquei-me com o calor quando tudo o que queria voltar a sentir eram as mãos geladas que me acalmaram a febre, naquela noite intermitente à porta trancada.
Consegui fechar-te tão facilmente que me alimentei do espanto.

E agora só escrevo para me convencer que não fomos em vão.




sexta-feira, 27 de junho de 2014


Talvez com a esperança vã de conseguir mudar o desenlace que já escrevemos ou com o desejo incontrolável de matar o silêncio perpétuo. 

(quero apunhalar todas as cartas que não me deixam dormir).

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Libertinagem

Que se lixe a liberdade quando as correntes do vício sabem tão bem.
Algemados a cadeiras de carne, sorrimos quando a destruição se torna real, quando as veias se dilatam e o coração explode, quando a dor quase que mata.
Agarrados ao ciclo, com desdém de quem usa lentes cor-de-rosa e máscaras de sorriso. Sem respeito por quem não sabe o que são insónias ou pesadelos ou lágrimas.
Dependentes da saudade porque sabemos que nunca vamos chegar ao futuro.

quarta-feira, 25 de junho de 2014


Menti-me quando gritei que sabes a pouco.
Podemos matar o tempo?

Putos.

Brincávamos com o "Era uma vez".
Na inconsciência abençoada deitávamos tudo ao ar e espalhávamos o que somos - o que fomos - em cima da mesa.
E vivíamos. Como se o amanhã fosse uma miragem, como se o futuro fosse ontem, como se cada átomo se esfumasse se o amor morresse.
O amor (sempre a merda do amor) que nem sequer se dignava a não ser cruel, que jogava com as lágrimas e se tornava no Monopólio que não conseguíamos ganhar.
E o quanto adorávamos. Aquelas partidas de desgosto e faz de conta, aquela falta de noção mascarada de juventude, aquele desespero que gritava


"Por favor, parte-me o coração".

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Caderneta de cromos

Folheei-te a caderneta; vi que era igual à minha.
Quase como se fôssemos putos - com uma ânsia sôfrega de significar uma coleção de vazios.
São páginas e páginas de corações partidos e nenhum deles se quer colar.

sexta-feira, 20 de junho de 2014

em ácidos.

Quando pensei que tinha saudades de casa fizeste-me beber-te.
- Foste o ácido com que eu mais gostei de me queimar.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Indiferença.


Foi de lançar as mãos ao céu. De gritar ao desespero. De amaldiçoar a crença.
Esmurrar o hoje para sentir o agora. Declarar guerra à indiferença. Intoxicar a dormência. Beber para lembrar. Magoar para respirar.
Fazer de tudo para sentir e acabar num nada ainda maior - naquele que seria o meu pesadelo se eu conseguisse finalmente dormir.

domingo, 15 de junho de 2014

E depois morri no degredo da implosão.
(Quando chegares traz-me de volta).

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Lembras-te de quando não respirávamos? De quando a noite nos mostrava os medos e os pesadelos éramos nós?
Lembras-te de quando não dormíamos? De quando a claridade chegava cedo demais e a realidade estupidificava as facas lançadas entre os beijos?
Lembras-te de quando não vivíamos? De quando nos tapávamos com a dor e nos consumíamos e nos destruíamos?

Lembras-te do quanto eu gostava?

Aeroporto

Quando as gargalhadas eram convulsões. Quando os olhos não estavam mortos. Quando a felicidade se bebia. Quando a saudade não voava. Quando o medo não ardia. Quando os dias não sangravam. Quando a dor se enterrava. Quando ela estava aqui.
Volta já.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Quando voltei a pegar no caderno que já não me conhecia o toque, escrevi até a mão sangrar.
Foi preciso que os olhos morressem e que o pulso cessasse para que as veias me escorressem tinta.
Foi preciso que as janelas se apagassem, que os cigarros se queimassem, que as vontades que fossem; foi preciso querer não existir para que as letras voltassem a ser o ar que não quero respirar.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Quando vieres

Diz-me o que sou, com esse teu jeito de acertar no erro.
Traz-me os beijos envenenados pelo ontem que nunca te acabou.
Conta-me os desejos repetidos, as vontades dos corpos e os tormentos das distâncias.
Fala-me das portas que tens escancaradas, das mentiras que tens concretizadas, das juras que morrerás antes de cumprir.
Lembra-me dos nossos anos roubados, dos desencontros planeados, das noites em que o mar nos fechou.
Mostra-me o teu fim porque já conheces o meu.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Pretérito Imperfeito

Éramos trapos.
Desfeitos e inúteis e sem fim. Sem rótulos e sem prazos de validade. Sem luz e sem sossego.
Éramos sujos. Sem mundo e sem morada. Sem rumo e sem sentido. Sem direito e sem propósito.
Éramos pretérito imperfeito. Sem nascer e sem ser e sem morrer.
Éramos nada e éramos velhos e éramos condenados e éramos uma frase que nunca conheceu pontuação.

Éramos.

domingo, 8 de junho de 2014

Entre-tantos


Enquanto lhe rasgava a pele. Lhe esfolava a alma.

Sem nunca lhe tocar.

Terapia.


Precisava de te beber o cinzento, de te ouvir o frio, de te cheirar a terra encharcada. Precisava de te injetar nas veias mortas e de te chorar a distância. Precisava de te ver as gentes, de te tocar as casas, de te sentir na dormência onde durmo agora.

Mogwai


Até que a vida se esvaiu em noite e o pulso se apagou.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Se.

Se eu soubesse não tinha subido a rua, não tinha rido da calçada, não tinha olhado para a cidade.
Se eu soubesse tinha-te fechado a porta e tinha-te fechado as mãos e tinha-te fechado a alma.

Mas fechei-te só os olhos e pedi-te para ficar.